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O massacre de Alto Alegre 161 cadáveres amontoados, insepultos, em estado de adiantada putrefação. O convento das freiras, até a capela, ensopados de sangue humano. Não mais uma pessoa amada, não mais um irmão capuchinho com o qual se haviam gastado os melhores anos de juventude no santo convento, na pátria, e de quem tanto suor se havia derramado nesta já tão florescente missão. Não mais uma religiosa, que, qual anjo, instruía e educava os selvagens. Não mais uma pessoa conhecida que morava em São José da Providência! A Colônia nem se podia comparar a um campo mortuário, e sim, apenas, a um campo silencioso, a um arraial depois de uma dura batalha. Ah, aquela vista foi uma espada terrível para o nosso coração!” Em meio às maiores dores, o Senhor manda sempre algum con- solo para conforto e alívio dos aflitos. O capitão Raimundo Ângelo do Rego Goiabeira, às quatro horas do mesmo dia, chega a Alto Alegre. Ele voltava de sua expedição contra os selvagens que se haviam fortificado na aldeia Canabrava. Prudente e valoroso, montou seus planos e atacou os selvagens. A resistência daquela vez foi encarniçada. A aldeia foi tomada de assalto. Dos selvagens, muitos foram mortos e feridos. Os demais, batidos de todas as partes, puseram-se em precipitada fuga. O capitão recuperou muita coisa que os selvagens tinham levado de Alto Alegre. Mas a maior consolação foi ter salvo a única menina supérstite do massacre, Úrsula Ribeiro. Ele retornou a cavalo e trouxe consigo, vesti- da como selvagem, a doce menina que já outras vezes escapara milagrosa- mente à morte. Foi um momento de grande comoção. Diante daquela úni- ca relíquia do massacre, quantos pensamentos afluíram à mente! Quantas lembranças! Apeada do cavalo, logo lhe foram prestados todos os socorros necessários, enquanto o capitão Goiabeira recebia os bem merecidos elo- gios e congratulações da parte dos padres capuchinhos, dos quais sempre foi e ainda é sincero amigo. O reverendíssimo vice-visitador, padre Giovanni, que, como já foi dito, encontrava-se na Barra do Corda, desejou visitar Alto Alegre. Para não dar na vista, usou vestes civis, e com um serviçal de nome Claro, sela- dos dois cavalos e armado até os dentes, partiu. Chegou a Alto Alegre perto do meio-dia de 1º de maio. Ao ver os cadáveres amontoados em valas, tal foi a sua impressão, que não quis ver mais nada, mas apenas voltar a Barra do Corda o mais rápido possível. No dia seguinte, partiu de Alto Alegre
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